quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

DIVERSIDADE DO PORTUGUÊS BRASILEIRO - ATALIBA DE CASTILHO (2010)




Trabalho realizado em coautoria com Rita de Cássia de J. Batista. Tem por objetivo mostrar a heterogeneidade do português brasileiro através de alguns tipos de variações expressas por Castilho (2010), como: variação geográfica, variação sociocultural, variação individual, variação de canal e variação temática.

1 A HETEROGENEIDADE DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
Segundo Castilho (2010), As línguas são construtivamente heterogêneas, pois através delas temos de dar conta das muitas situações sociais em que nos envolvemos, em nosso dia a dia. Elas são também inevitavelmente voltadas para a mudança, pois os grupos humanos são dinâmicos, e as línguas que eles falam precisam adaptar-se às novas situações históricas.
Variação e mudança são propriedades linguísticas que não impedem a intercompreensão, porque obedecem a uma sistematicidade e a uma regularidade.
Os seguintes eixos organizam a heterogeneidade/diversidade do PB:   Variação geográfica; Variação sociocultural; Variação individual; Variação de canal; Variação temática.
     Cada uma dessas variações, por sua vez, é organizada por um conjunto de variantes, ou seja, um conjunto de usos linguísticos considerados relevantes para a caracterização de uma variedade. Com isso, entende-se por variação a manifestação concreta da língua, e por variedade a soma idealizada das variações.
                               Variante > variação > variedade 
Para estudar a variação linguística, temos de selecionar um conjunto de variantes. Em suma, o conjunto de variantes configura uma variação, e o conjunto das variações configura a variedade linguística. A pesquisa sociolinguística tem demonstrado que as regras variáveis são correlacionadas com fatores sociais e fatores estruturais.

2 VARIAÇÃO GEOGRÁFICA
Falantes do PB, como de qualquer outra língua natural, procedem de determinado espaço geográfico. Há uma correlação entre a região de origem dos falantes e as marcas específicas que eles vão deixando em sua produção linguística.
Portugueses e brasileiros não falam do mesmo jeito. Brasileiros do Norte, do Nordeste, do Sudeste, do Centro-Oeste e do Centro-Sul tampouco falam exatamente do mesmo jeito. Uma língua natural conterá, portanto, diferentes dialetos*, relacionados ao espaço geográfico que ela ocupa. De todas as variedades do português, a variedade geográfica é a mais perceptível.

2.1 A DIALETOLOGIA BRASILEIRA
Segundo Ferreira/ Cardoso (1994:37-63), três fases assinalaram o desenvolvimento da Dialetologia brasileira.
A primeira fase vai de 1826 a 1920, caracterizando-se “pela produção de trabalhos voltados, basicamente, para o estudo do léxico e de suas especificidades no PB, de que resultaram numerosos dicionários, vocabulários e léxicos regionais” (Ferreira/ Cardoso, 1994: 15).
A segunda fase vai de 1920 a 1952. O período foi inaugurado pelo paulista Amadeu Amaral, ao escrever O dialeto caipira. Ele observou os usos do português em Capivari, Piracicaba, Tietê, Itu, Sorocaba e São Carlos, descrevendo detalhadamente a pronúncia, questões de gramática e de vocabulário da região. Antenor Nascente publicou em 1922 O linguajar carioca, livro que chamou a atenção para a importância da Dialetologia, ele organizou o primeiro mapa dialetológico brasileiro, o qual tem sido tomado como referência pelos pesquisadores atuais.
A terceira fase vem de 1952 até a atualidade, caracterizando-se “pela produção de trabalhos com base em corpus constituído de forma sistemática e é marcado(a) pelo início das preocupações com o desenvolvimento dos estudos de Geografia Linguística no Brasil”
Mas foi Nelson Rossi, linguista carioca filiado à Universidade Federal da Bahia, que saiu a campo com uma equipe que ele prepara, publicando os primeiros atlas linguísticos regionais do Brasil. A opção pelos atlas regionais explica-se pela enormidade do território brasileiro, entre outras dificuldades.

2.2   FALARES BRASILEIROS
2.3   A sociedade brasileira tem-se caracterizado nos últimos trinta anos por uma enorme mobilidade, causada pela intensa urbanização e pela expansão da fronteira agrícola. No começo do século XX, apenas 8% da população habitava as cidades, porcentagem que passou para 36% na década de 1950, para 67,6% na de 1980, e pouco mais de 80% no final do século XX.
Nos dois casos, passam a conviver brasileiros de regiões geográficas diferentes, usuários de falares igualmente diferentes.

3 VARIAÇÃO SOCIOCULTURAL
Mesmo que se considerem os falares do PB originários de uma mesma região, ainda assim sua linguagem varia, pois cada falante procede de um segmento diferente da sociedade. Costuma-se sistematizar as variedades socioculturais levando em conta as seguintes variáveis:
  Falantes não escolarizados - analfabetos usam o português popular, ou variedade não culta;
Falantes escolarizados - pessoas escolarizadas falam usam o português culto, ou variedade padrão.    
É preciso deixar claro que: quando distinguimos PB popular e PB culto, estamos nos referindo a variações socioculturais não separáveis rigidamente. Ninguém é exclusivamente “falante popular” nem “falante culto”. Quem pratica o português popular não “fala errado” – apenas opera com a variedade correspondente ao seu nível sociocultural e Quem pratica o português culto não “fala certo” – apenas se serve da variedade correspondente ao seu nível cultural. Ninguém usa o português formal numa situação familiar, ninguém fala como se falava no passado.

4 VARIAÇÃO INDIVIDUAL
A variação individual é mais uma das exceções do português brasileiro que inclui: o registro, a idade e o sexo. 
   
1. REGISTRO: PB Formal e PB Informal
  O espaço social interindividual se caracteriza a partir de diferentes graus de intimidade, tendo assim o registro, variando entre o PB formal (ou refletido) e o PB informal (ou coloquial).

Por exemplo:
Bilhete para a namorada:
“Oi Bia:
Seguinte. A gente combinou de ir no cinema amanhã, sessão da tarde. Não vai dar.
Me esqueci que tem uma prova no colégio, e se eu não estudar minha velha me pega pelo pé. Eu, hein?
Tô fora. Você me entende.
Beijocas,
Pedrão”.
Carta para o patrão:
“Senhor gerente:
Terei de faltar amanhã ao trabalho em razão de uma prova bem difícil, no colégio. Precisarei estudar, pois se eu for mal nessa prova minha mãe vai ficar muito nervosa. Espero que o senhor compreenda minha situação e que me desculpe.
Atenciosamente,
Pedro” (Castilho, 2010).

2. A IDADE
Sabemos que pessoas de diferentes idades falam de acordo com seu contexto de vivência. Os jovens, por exemplo, usam de gírias.

3. O SEXO: português de homens e mulheres
Homens e mulheres também falam e usam expressões diferentes. Por exemplo:
Homem: Cara, preciso te dá ideia do que rolou ontem na festa.
Mulher: Ai amiga, preciso te contar o que aconteceu ontem.
Homem: Comprei uma camisa massa.
Mulher: Amiga, comprei uma blusinha linda.

5 VARIAÇÃO DE CANAL
“A comunicação linguística pode ocorrer em presença do interlocutor, quando falamos, ou na sua ausência, quando escrevemos. Isso nos leva à variação de canal,  a língua falada e a língua escrita.” (CASTILHO, 2010).

PORTUGUÊS FALADO:
Histórico dos estudos sobre a oralidade:
1º momento: Antes da invenção do gravador portátil, onde a observação da língua falada se dava em segmentos conversacionais recolhidos de memória e registrados no papel;
2º momento: marcado pelo uso do gravador, pela organização da língua falada, pelo debate das formas de transcrição e pelas análises dos materiais levantados. A língua falada se constitui assim, como objeto científico.
Metodologia para os estudos da oralidade: a gravação e a transcrição
Para gerar um documento da língua falada, os falantes são selecionados por critérios geográficos e sociolinguísticos e são escolhidos o tipo de entrevista: monólogo informal/formal, diálogo informal/formal, conversa telefônica.

Caracterização da língua falada
Uma caracterização da língua falada passa por tais pontos:
1)      A língua falada resulta de um dialogo em presença, imediato, ou de ausência, como na conversa telefônica;
2)      A língua falada documenta simultaneamente dois momentos: o planejamento, pré-verbal, de caráter cognitivo, e o a execução verbal de caráter sociointeracional;
Na Gramática há a reunião dessas propriedades, configurando-se na chamada sintaxe colaborativa.

1) Língua falada como diálogo em presença:   
     A linguagem humana é fundamentalmente dialógica, a diferença é que na língua falada os usuários estão em presença e a construção enunciativa se dá na interação.
     “Locutor e interlocutor assumem a coautoria do texto, que vai sendo gerado numa forma interacional, obrigando ambos a uma sorte de coprocessamento sintático.” (Blanche-Benveniste, 1986:91)

2) Língua falada como planejamento e execução simultâneos: O planejamento corresponde a fase cognitiva onde selecionamos o que vai ser dito e analisamos as condições de interação para dizer o pretendido, e fase de execução é a fase verbal em que representamos no léxico e na gramática as ideias adequadas ao ato de fala através da representação fonológica.  E ambas as fases são simultâneas, no tempo real.Pois todos os falantes estão em presença e tudo “vai para o ar”, simultaneamente pensamos e falamos.

3) Agenda para uma sintaxe colaborativa:
A sintaxe colaborativa é a organização da estrutura gramatical da língua falada.
A “sintaxe colaborativa” envolve pelo menos três áreas de pesquisa:
a) Elipse e anacoluto;
Se caracterizam pelas descontinuações da fala, da omissão de termos fazendo com que as frases tenham uma incoerência lógico-gramatical.
Ex.: (1) bom... A cozinha também Ǿ estilo moderno (= em estilo moderno)
(2) Cada um já fica mais ou menos responsável por si pelo menos... De si... Fisicamente né? de higiene... de... trocar roupa... todo esse negócio.
b) Segmentos epilinguísticos;
São epilinguísticos os segmentos em que o falante conversa sobre a língua, negando uma expressão, voltando atrás, vendo a melhor forma de expor a ideia:
O terreiro (...) é: como poderia chamar? Um chão.  
c) Repetição de constituintes.
A repetição é mais um elemento da língua falada, na medida em que repetem vão construindo a estrutura funcional da sentença, permitindo ao observador desvendar importantes mecanismos de constituição e funcionamento da linguagem.

PORTUGUÊS ESCRITO:
Sobre a especificidade da língua falada e da língua escrita, os estudos nos levam a três direções:
1) Apenas a língua falada tem estatuto próprio, sendo a língua escrita uma transposição da primeira (Câmara Jr);
2) Que língua falada e língua escrita são autônomas, entendendo que na língua falada o sentido está no contexto e na língua escrita o sentido está no texto (Olson/Torrance);
3) Língua falada e língua escrita se dão num continuum de usos, integrados por diversos pontos focais (Tannen; Chafe; Berruto; Biber; Marcuschi).

Caracterização da língua escrita: processos e produtos
Há pelo menos dois processos constitutivos da língua escrita:

1) É um diálogo que ocorre em ausência do interlocutor:
O leitor ao qual se escreve, encontra-se em ausência física, assim as expressões tem que ser mais explícitas, em que a língua escrita se torna dependente do próprio texto refletindo em sua unidade, o parágrafo. 

2) O planejamento e a execução ocorrem em momentos distintos:
O planejamento e a execução não coincidem no tempo, pois no texto escrito, o autor pode escrever, refazer, dando ao texto escrito uma maior elaboração, porém dissimula o processamento linguístico.
Quanto aos produtos destes processos temos pelo menos:
1) O parágrafo: § = signum sectionis (símbolo do corte) é a unidade da língua escrita. No parágrafo não se pode omitir o tópico, e as ligações com o que precede ou sucede devem ser indicadas através de expressões como primeiramente, em segundo lugar, em consequência, voltando ao ponto, etc.
2) Uma sintaxe especializada: “A tradição gramatical do Ocidente repousa sobre a língua escrita.”. Temos a presença de estruturas sintáticas mais elaboradas, como a nominalização e subordinação; uso abundante da voz passiva; sentenças declarativas predominando sobre as interrogativas e imperativas, etc.

3) Diversidades de escrita e gêneros discursivos:
1. Língua escrita corrente:
Tem seus fins utilitários, como a manutenção de contatos familiares e de negócios; difusão de notícias; ordenamento do direito público; garantia dos direitos privados; documentos de administração pública, etc. Esta é mais conservadora, por assentar direitos dos cidadãos e do Estado.
2) Língua escrita literária
“Tem uma finalidade artística, sendo sustentada por projetos estéticos. Ela tende a ser mais inovadora, pois os escritores buscam continuadamente interpretar seu tempo, expressando-se de modo individualizado.”

6 VARIAÇÃO TEMÁTICA

PORTUGUÊS CORRENTE: São os assuntos do dia a dia.
PORTUGUÊS TÉCNICO: São os assuntos especializados, é a linguagem comum de médicos, cientistas, políticos, clérigos.
Exemplos: Português Corrente: “Em alguns casos de câncer de boca, as células da pele perdem funções próprias, ganhando  funções típicas das células conjuntivas. Quando isso acontece, elas produzem proteínas especificas das células conjuntivas.  Uma série de eventos acontecem então, tais como a perda de sua coesão e a invasão das células conjuntivas, (em busca dos vasos  sanguíneos), promovendo o espalhamento do câncer pela boca.”
Português Técnico: “A transição epitélio-mesenquimal é um processo-chave na invasão e metástase em carcinomas, sendo responsável pela ativação de genes epiteliais como as Citoqueratinas. Uma série de eventos segue a transição epitélio-mesequimal, como a perda da adesão celular, a síntese de componentes exclusivos da matriz extracelular como a glicosaminoglicana Fibronectina e a síntese de proteases como a Estromelisina-1.”
OBSERVAÇÃO:
Alguns termos técnicos passaram para o uso corrente, como termos referentes ao futebol e ao carnaval:
Vocês são um time unido, parabéns!
Coitado, ficou para escanteio a vida toda.
Sabe aquele cara de mau hálito? Foi chegando e, para escapar, dei o maior chapéu. Sai fora!
Você ganhou no quesito paciência.

CONCLUSÃO
Com base no que vimos, percebemos que o português brasileiro como qualquer outra língua possui variações por sua heterogeneidade e pela adaptação ao longo do tempo, das mudanças que ocorrem em todas as línguas. Observamos o estudo de cinco tipos específicos de variação que Castilho (2010) dispõe em seu livro.Com relação a variação geográfica refere-se a diferentes formas de pronúncia, às diferenças de vocabulário e de estrutura sintática entre regiões.
         Com relação a variação social pode-se agrupar alguns fatores de diversidade: o nível socioeconômico, o grau de educação, a idade e o gênero do indivíduo. O uso de certas variantes pode indicar qual o nível socioeconômico de uma pessoa.
Quanto à variação individual, esta é composta pela variação de registro, de idade e de sexo, correspondendo as relações interindividuais. A variação de canal corresponde ao português falado (diálogo em presença) e o português escrito ( comunicação em ausência) e a variação temática é com relação ao português do cotidiano e o português  técnico, comum à determinadas áreas.  
            Portanto, o português brasileiro é caracterizado por sua grande variedade de falares espalhados por todo o Brasil.

REFERÊNCIAS
CASTILHO, Ataliba T. de. Nova Gramática do Português Brasileiro. São Paulo: Ed. Contexto, 2010.

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